A Universidade Federal de Ouro Preto reagiu, afirmando que a autonomia universitária foi ferida de morte
Maria Clara Prates
Entrada de auditório usado em calourada: universidade fica proibida até mesmo de pagar funcionários e fornecedores
O juiz da 5ª Vara da Justiça Federal do Maranhão, José Carlos do Vale Madeira, suspendeu ontem, liminarmente, o funcionamento do Centro de Difusão do Comunismo (CDC), da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), até o julgamento final de ação popular apresentada pelo advogado Pedro Leonel Pinto de Carvalho em agosto. De acordo com o juiz, a administração “não pode disponibilizar bens públicos para a difusão de doutrinas político-partidárias por mais relevantes que sejam historicamente”.
Com a concessão da tutela antecipada, a Ufop fica impedida de dar prosseguimento “à execução de toda e qualquer decisão ou ato administrativo tendente a dar seguimento às atividades do Centro de Difusão do Comunismo, como, e não exclusivamente, a contratação de professores, a concessão do bolsas de estudos, disponibilização de dependências, compra de material e insumos e divulgação institucional de objetivos e atividades do programa”. E não fica só nisso. A universidade está proibida ainda de fazer qualquer pagamento em relação à atividade, como funcionários e professores, e terá que dar publicidade à decisão judicial.
Na ação popular, o advogado Pinto de Carvalho alega que o programa, sob o pretexto da autonomia universitária, fere os princípios da moralidade e da legalidade da administração pública, prevista na Constituição, ao usar recursos públicos para divulgar ideologia político-partidária. Mesmo depois de ouvir a universidade, o juiz acatou a alegação do advogado, ao admitir que o programa prioriza uma ideologia, que ofende o pluralismo político, previsto constitucionalmente.
“Não bastasse a justificativa e os fundamentos do Centro de Difusão do Comunismo, o símbolo usado pela Universidade Federal de Outro Preto para divulgá-lo é precisamente aquele, universalmente, associados aos partidos comunistas, ou seja, uma foice e um martelo; este símbolo, com pequenas variações, usados pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e Partido Comunista Brasileiro (PCB)”, disse Vale Madeira. Nas informações, requisitadas pela Justiça, a Ufop disse que seu programa é ligado à Pro-Reitoria de Extensão e tem como objetivo “lutar por sua sociedade além do capital”.
MULTA Na decisão, o juiz Vale Madeira poupou a Ufop apenas do pagamento de multa, em caso de descumprimento da determinação. Ele afirmou que isso se deve à ausência de antecedente de não atendimento à ordem judicial. A Ufop reagiu ao tomar conhecimento da decisão, publicada anteontem. Por meio de nota, esclareceu que o Centro de Difusão do Comunismo não é “um programa acadêmico com objetivos político-partidários, e sim, trata-se de extensão, vinculado ao Curso de Serviço Social, para organizar e articular quatro ações de extensão (dois cursos e dois projetos) e oferecê-las de forma gratuita a toda a comunidade, que se insere no programa por livre escolha”.
Para a Ufop, a autonomia universitária “foi ferida de morte” com a decisão judicial, além do que, as instâncias que aprovaram e acompanharam o programa, criado em 2012, foram “completamente ignoradas e achincalhadas”. A nota acrescenta que “o pluralismo de idéias próprio a uma instituição federal de ensino público foi jogado no lixo e, pasmem, utilizado contra o programa, acusado de cercear o debate”. A instituição lembrou ainda que “inúmeros alunos bolsistas envolvidos no programa com ações de ensino, pesquisa e extensão ficarão sem receber suas bolsas, o que compromete a sua permanência na universidade”. A Ufop aguarda notificação da Justiça para deicidir se recorrerá da decisão.
Saiba mais
Figura carimbada
A ação popular movida pelo advogado Pedro Leonel Pinto de Carvalho é a terceira que ele propõe contra a União, em apenas dois meses. Na primeira delas, ele questionou editais do Ministério da Cultura que previam a participação exclusiva de negros em projetos nas áreas de cinema, literatura e pesquisa. A alegação era que as exigências tinham cunho racista por excluir outras etnias. A ação foi julgada procedente pela 5ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão, a mesma que julga a ação contra o CDC. O segundo processo foi contra estatal do setor de energia. Pedro Leonel conseguiu na Vara de Interesses Difusos e Coletivos da Comarca de São Luís impedir que a empresa pague pela compra de uma usina nos Estados Unidos. O advogado afirma já contabilizar mais de 300 ações contra o governo federal. “O que me move é o exercício da cidadania”, argumenta.