Descobri, há bom tempo, que o Partido dos Trabalhadores tem conceitos
próprios sobre democracia e Estado de Direito. Para o PT, democracia é
algo que só acontecerá quando ele, partido, exercer a hegemonia e
controlar todos os instrumentos do poder. Enquanto isso não se
concretiza plenamente, o PT vai manipulando os meios que o regime
vigente propicia ao curso de seu projeto.
Graças a isso, o partido conseguiu não ser apenas o PT. Ele é o PT e
mais um vasto conjunto de corpos sociais que gravitam ao seu redor. São
sindicatos e centrais sindicais; instituições culturais e de ensino;
movimentos sociais e grupos minoritários que ele transforma em grupos de
pressão a seu favor; grêmios estudantis, diretórios, centros acadêmicos
e uniões de estudantes; partidos políticos sem anticorpos contra o uso
de recursos públicos; organizações não governamentais; entidades
relacionadas às políticas de gênero, ligas pró-aborto e defensoras da
liberação das drogas; igrejas e órgãos de peso como a CNBB e a OAB que,
convertidos ao rebanho, se entregam à alcateia. Ah, e os conselhos
capturados pelo PT! Eles se revelam tão úteis que o partido, agora,
pretende "empoderá-los" (coisas da novilíngua petista...) em todo o
aparelho estatal federal. A isso e a outro tanto que resultaria
exaustivo relacionar, juntam-se, sempre que necessário, organismos e
instituições internacionais de isenção mais do que duvidosa.
Para o PT, democrática é toda manifestação desse grupo aí acima.
Democrático é o que faz cada tentáculo seu. Ouvi-los, para o PT, é ouvir
o povo. E quem o nega passa a ser tratado como cordeiro intrometido no
riacho do lobo, acusado das piores ações e intenções.
Tão estranho quanto a democracia petista é o "Estado de Direito"
petista. Nele, Direito é o que o partido quer. Por bem ou por mal.
Perguntem ao companheiro João Pedro Stédile que, nesses assuntos, fala
pelo partido. E Estado de Direito é algo que vai até onde o PT quer. Por
bem ou por mal. Sobre essa parte conversem com o companheiro Gilberto
Carvalho. O Estado Direito petista é moldável e elástico segundo suas
necessidades. Procurem um pouco e não será difícil encontrar por aí
traços comuns aos três totalitarismos do século passado.
Mas no jogo que o PT joga, o Brasil é apenas uma peça do tabuleiro. O
jogo tem pretensões maiores. Começou em 1990 com o Foro de São Paulo,
promovendo uma convergência multifacetária da esquerda na América Latina
e desaguou na União das Nações Sul-Americanas, criada em 2006. Em mais
recente estágio, no dia 5 de dezembro, em Quito, com a presença de
Dilma, esse organismo, que congrega os países do continente, decidiu
criar um programa de formação de quadros militares.
Trata-se da Escola de Defesa, que tem dois objetivos explícitos:
produzir uma unidade interna que elimine possíveis conflitos
intrarregionais e fortalecer a América do Sul contra o inimigo externo,
vale dizer, contra o inimigo ianque. Procure no Google por Unasul e por
"Escola de Defesa" (em espanhol e em português), e encontrará informação
suficiente. Esse estrupício foi instituído pelo bloco para que o
conjunto das Forças Armadas de todos os países componham algo que outra
coisa não é senão uma versão bananeira do Pacto de Varsóvia.
* Percival Puggina (70), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org,
colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor
de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e
Gaviões, integrante do grupo Pensar