
Após ter disseminado todo o tipo de valor subversivo ao redor do mundo
[1], não deixando nem as estruturas do Vaticano livres de contaminação, a Rússia parece surgir como farol moral do mundo e último reduto do conservadorismo em uma era de ebulições revolucionárias. A estratégia do comunismo em se fazer parecer outra coisa completamente diferente para confundir o inimigo parece ter tanto sucesso que já existe conservador tecendo louvores a Vladimir Putin.
A ascensão do “conservadorismo” russo não poderia ocorrer sem a queda da imagem de um dos seus maiores rivais geopolíticos: os Estados Unidos. A URSS, que já dantes da Guerra Fria infiltrara agentes subversivos em espaços estratégicos da América, hoje colhe os frutos de um longo período de [im]plantação de corrupção moral do governo americano.
Se os EUA são uma nação cristã e temente a Deus, não é o que suas ações envolvendo governo civil e política externa demonstram. Poderão frutos bons saírem de uma árvore má?
Os russos estão vencendo a guerra contra os americanos sem disparar nenhum tiro, apenas ensinando-lhes como se render ao que de pior existe com a doutrina do politicamente correto. Internamente, os EUA hoje favorecem políticas que atacam a família, a religião cristã, promovem o aborto e o uso de drogas. Externamente, se metem em qualquer conflito ideológico para expandir sua atuação no globo. Foi assim que os EUA invadiram o Iraque sob o pretexto de depor um ditador assassino e acabaram colocando no comando um grupo terrorista responsável pelo genocídio de cristãos, yazidis e qualquer outro grupo étnico-religioso que não queira se render ao pacifismo do islã.
Que os EUA criaram o Estado Islâmico (EI) não é mais surpresa para ninguém, e até mesmo a direita americana está ciente disso
[2]. A Operação Liberdade no Iraque treinou e forneceu armamento para milícias locais em nome do combate o terror, mas “combate ao terror”, àquela altura, era treinar grupos insurgentes que mais tarde lutariam para depor o regime de Muamar Kadafi (a maioria controladas pela Al-Qaeda, na Líbia) e de Bashar al-Assad (Al-Nusra, Síria), que o presidente George W. Bush havia definido como integrantes do “eixo do mal”
[3]. A Frente Al-Nusra – braço da Al-Qaeda na Síria – estaria sob a supervisão direta dos EUA, enquanto que o ISIS, que veio de dentro da Al-Qaeda, saiu de controle.
A leniência dos EUA e dos países aliados em combater o EI de forma efetiva é devido ao fato de que o EI também é uma ameaça ao Governo sírio. Acabar com os rebeldes e com EI, o grupo anti-Assad com maior efetivo e poderio bélico na região, é diminuir as chances de uma deposição de Assad. O governo americano parece estar mais interessado em permitir a barbárie do EI, financiando grupos radicais com dinheiro do contribuinte, do que perder influência no Oriente-Médio.
A Rússia, que deu início às ações aéreas na Síria bombardeando em um único dia mais territórios rebeldes do que os EUA e aliados em meses, parece promover um verdadeiro turning point não apenas na região controlada pelo EI, mas na imagem que agora tenta sustentar perante a política internacional. Putin se aproveita do momento de fraqueza do governo americano para elevar sua imagem de bastião dos valores tradicionais.
Nossos conservadores, seduzidos pela defesa que o presidente russo vem fazendo do conservadorismo moral, já andam dizendo que Putin é o novo Comandante-em-chefe do Médio oriente, esquecendo-se das alianças de presidente russo com o aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do Irã, que pretende varrer Israel do mapa
[4], com a socialista China, que aumentou consideravelmente seu efetivo militar, e do envolvimento de Bashar al-Assad com o Hamas e o Hezbollah, grupos jihadistas também abertamente favoráveis a destruição do Estado israelense.
Após ter corrompido o Ocidente de tal forma que ficamos parecendo um cadáver em estado avançado de decomposição, a Antiga União Soviética personificada no “ex”-agente da KGB surge como único país do globo a condenar o mal que ela mesmo criou. Não precisamos lembrar que do mesmo modo agiu Lênin e Stálin, que condenando a miséria libertina dos EUA e o nazismo alemão, criaram um terror para o povo russo difícil de ser superado em número de cadáveres.
Com sorte o bloco de poder eurasiano não sairá desse conflito com a imagem e o prestígio de serem os novos defensores de um conservadorismo moral e cristão. São apenas lobos em peles de cordeiros.
Escrito por Felipe Lomboni. Publicado inicialmente sob o título “Rússia: Pátria Conservadora?”. Blog
O Reacionário.